terça-feira, 9 de junho de 2009

Entrevista realizada pela Associação dos Procuradores do Estado do Espírito Santo - APES

Aproximação entre Estado e Cidadão e rodízio nos cargos de confiança da Procuradoria Geral do Estado do Espírito Santo

Entrevista Leonardo Pastore
Capixaba, 33 anos, Leonardo Gustavo Pastore Dyna, é Procurador do Estado do Espírito Santo desde 2005. Aprovado para a Procuradoria do Estado do Espírito Santo, para a do Distrito Federal e para a Advocacia Geral da União, dentre outros concursos, optou por fazer carreira em sua terra natal e defende a autonomia da Procuradoria, o rodízio nos cargos de confiança, a elaboração de lista tríplice para a escolha do Procurador-geral e interação entre a Procuradoria do Estado, outros entes públicos e o cidadão.

Apes em ação – Como o senhor resume o dia a dia de sua função de Procurador do Estado?
Dr. Pastore – A Procuradoria do Estado sempre foi uma meta profissional em minha carreira. Logo nos primeiros anos do curso de Direito, identifiquei a advocacia como vocação. Quando me formei, em 2000, não tinha a intenção de prestar qualquer concurso, exceto para a advocacia pública. Desde nosso ingresso na PGE, travamos uma luta diária pela defesa do Estado. Como em qualquer função, temos as nossas alegrias e nossos dissabores. Mas, no nal, é nítida a sensação do dever cumprido.

Apes em ação - Dos 25 procuradores empossados com o senhor, muitos desistiram do cargo e estão atuando em outras carreiras. Por quê?
Dr. Pastore – Posso dizer que a maioria esmagadora destes colegas tinha vocação para a advocacia pública. Dos 25 primeiros aprovados no concurso, apenas 11 eram aqui do Estado, ou seja, o concurso de 2004 atraiu gente de todo o Brasil. Certamente a evasão dos colegas se deu pelo choque entre sonho e realidade. Para você ter uma idéia, quando tomamos posse, não tínhamos sequer uma mesa reservada para trabalhar; não tínhamos um documento que nos identificasse como Procuradores; uma mesma impressora era (e isso ainda continua) dividida por duas ou três setoriais e dezenas de servidores. Quando o edital do concurso de 2004 foi lançado, a remuneração dos Procuradores do Estado era uma das mais altas do país, e hoje é uma das piores. Ao mesmo tempo, outras carreiras se mostraram mais atraentes do ponto de vista estrutural, institucional e remuneratório, e acabamos perdendo colegas de reconhecida competência, que hoje são Juízes de Direito, Promotores de Justiça, Procuradores do Trabalho, Advogados da União, Procuradores da Fazenda Nacional, etc. Apesar de certa melhora física na estrutura da PGE, ainda temos problemas graves.

Apes em ação – Pode dar um exemplo?
Dr. Pastore – Na Subprocuradoria Tributária, por exemplo, temos apenas dois computadores reservados para o uso de nove procuradores. Não é incomum faltar dinheiro para a reprodução de cópias xerográficas de processos. Não há veículos exclusivos para o transporte de procuradores para a realização de audiências no interior do Estado, etc. Tenho colegas que já pagaram do próprio bolso valores que o Estado deveria disponibilizar com rapidez, mas não faz.

Apes em ação – O que fazer para mudar?
Dr. Pastore – As Leis Orçamentárias Anuais comprovam que o orçamento destinado à Procuradoria diminuiu, embora o trabalho e os resultados obtidos pelos procuradores tenham aumentado. Em 2004, 0,33% do Orçamento do Estado era destinado à PGE. No ano seguinte, 2005, foi de 0,19%, e em 2006 e 2007 passou para 0,17%. Só a autonomia financeira e orçamentária acaba com isso. A Constituição diz que a consultoria jurídica e a representação judicial do Estado cabem às Procuradorias dos entes federados. Veja bem, a consultoria e representação do Estado. Em outras palavras, os Procuradores são procuradores dos Estados e não dos governos. Os governos passam e os Estados cam. Não estamos lá para atender os interesses de A ou B ou para viabilizar planos de governo, mas sim para atuar na esteira da legalidade, com autonomia e independência. Por isso, naturalmente a PGE não pode ficar “refém” do ordenador de despesas. Um orçamento previamente definido em lei e afastado da vontade do Executivo permitirá que as Procuradorias não fiquem à mercê do vai e vem da política.

Apes em ação – O senhor foi empossado recentemente para uma das vagas eletivas que compõem o Conselho da PGE. O que poderia ser aprimorado no CPGE?
Dr. Pastore – Acredito que o Conselho deve permitir que a Procuradoria adote uma posição pró-ativa, além das tarefas jurídicas ordinárias. Por que não propor um trabalho conjunto com o Ministério Público, com a Advocacia Geral da União, Procuradoria da Fazenda Nacional, com a Procuradoria dos municípios? Somar esforços, trocar informações. Ao mesmo tempo, será que o Conselho da Procuradoria não pode trabalhar para que o Estado passe a efetivar mais os direitos fundamentais dos cidadãos? As estatísticas mostram que o maior número das ações que tramitam hoje na Justiça brasileira envolve o Poder Público. Isso não quer dizer que o Poder Público está sempre errado, mas muitos dos recursos processuais que são interpostos o são com o entendimento prévio de que não serão acolhidos nos Tribunais. Não vejo sentido nisso. Se o cidadão está certo, sob que argumento o Estado deve prorrogar a efetivação de seu direito através de uma demanda judicial? Para que prolongar o sofrimento dessa pessoa para chegar daqui a cinco, dez anos e dizer que ela tem razão? Ela já pode ser reconhecida como detentora daquele direito desde já. Por isso acho que o Conselho deve deliberar sobre matériasnas quais o Estado pode reconhecer a procedência do pedido da parte contrária, sem a necessidade de alongar a controvérsia no plano judicial. Assim como o advogado não deve permitir que o cliente entre numa aventura jurídica, o Conselho da PGE deve impedir que o Estado prolongue o sofrimento do cidadão quando sabe que o ente público errou ou quando será vencido. Basta de recorrer até a última instância quando se sabe que o Estado será perdedor!

Apes em ação – Na sua opinião, poderia a PGE interferir nas políticas públicas?
Dr. Pastore – Com certeza sim. As Procuradorias dos Estados dão o suporte jurídico judicial e extrajudicial aos Estados. Lembro, por exemplo, que a Constituição diz que é dever do Estado prover educação para os cidadãos, determinando uma percentagem mínima do orçamento que deve ser gasta neste setor. Nos últimos anos, temos visto o governo do Estado do Espírito Santo conceder abonos pecuniários para os professores, o que é prova viva que o governo gastou mal o dinheiro, pois quando deveria investir na escola pública, através de projetos, cursos, estrutura, acaba distribuindo o recurso numa simples equação matemática, o que qualquer um faz. Isso é a prova do dinheiro mal gasto, mas é a política do Poder Executivo. O Conselho da PGE poderia estabelecer o entendimento que a concessão de abonos pecuniários é inválida pois não atende o interesse maior da Constituição. Não sou contra a valorização do servidor público, pelo contrário, mas temos que cuidar para que o direito fundamental do cidadão não ceda passo à incompetência governamental, afinal, somos Procuradores do Estado e não do Governo.

Apes em ação – Quais outras idéias o senhor gostaria de ver debatidas no Conselho?
Dr. Pastore – No plano institucional, uma maior rotatividade das chefias das Subprocuradorias e do próprio Procurador Geral do Estado. Mudar faz bem, oxigena. A Constituição Estadual permite que o Procurador Geral do Estado seja nomeado livremente pelo governador, dentre os integrantes da carreira, mas não limita prazo para o desempenho da função, e a legislação franqueia ao Procurador Geral nomear os Procuradores Chefes das Setoriais, além dos Subprocuradores Gerais e do Corregedor, podendo mantê-los na função pelo tempo que desejar, o que, a meu ver, engessa a Procuradoria. Não estou dizendo que as pessoas que hoje ocupam esses cargos não são adequadas, mas sim que é interessante haver uma rotatividade. Que cada chefe fique até um ano ou dois na função e depois haja um rodízio. E a escolha do Procurador Geral poderia ser precedida da indicação, pela carreira, de três nomes para que fossem submetidos à escolha do Governador, além de também ter um mandato com limitação de tempo.

Apes em ação – Qual o papel da Associação dos Procuradores, que este ano está completando 25 anos?
Dr. Pastore – A Associação vem crescendo ao defender nossas prerrogativas, buscar uma maior interface com a opinião pública, bem como a valorização do Procurador. Recentemente, foi criada a Revista da Associação dos Procuradores e a Escola da Associação, onde já realizados cursos com lotação esgotada. Ultimamente, a classe tem encarado obstáculos quase intransponíveis na luta a favor da dignidade da carreira. Temos a evasão, um orçamento inconsistente, a falta de condições de trabalho, a defasagem remuneratória, o desrespeito às prerrogativas e até mesmo provocações públicas de altas autoridades em nosso desfavor. Por sorte, temos colegas do mais alto gabarito no comando da Associação, dos quais cito aqueles que por lá passaram desde nosso ingresso na carreira, o Dr. Christiano Dias Lopes Neto, cuja atuação à frente da Apes foi fundamental para a realização do concurso de 2004; O Dr. Gustavo Holliday, que promoveu um crescimento institucional sem precedentes na história da Apes. Por último, nossa querida e combativa Santuzza da Costa Pereira, que vem protagonizando um verdadeiro duelo de Davi contra Golias na defesa da carreira, das prerrogativas e da valorização do Procurador.

Apes em ação – E quem é o Golias?
Dr. Pastore – Ah... isso você sabe... e o final da estória todossabem também.

Nenhum comentário: