Discussão áspera na corte é exemplo do que não deveria ocorrer num tribunal que redefine, para melhor, sua vocação
O Ministro Joaquim Barbosa excedeu-se na áspera discussão travada anteontem com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Não se justificam os argumentos "ad hominem" e a linguagem desabrida empregada por Barbosa em sessão aberta na mais alta corte brasileira.
É notória a desproporção entre o objeto do debate - uma lei paranaense que estende a aposentadoria do setor público a funcionários de cartórios, considerada inconstitucional- e a exaltação dos dois debatedores. Mendes entendeu que Barbosa o estava acusando de sonegar informações sobre os autos e a seguir insinuou que o ministro faria julgamento "por classe" social.
Joaquim Barbosa então retrucou, dando a entender que outros ministros não zelavam pelas conseqüências de suas decisões. Mendes elevou ainda mais a temperatura ao dizer que Barbosa "não tem condições de dar lição a ninguém". Foi no ato seguinte, entretanto, que o ministro Barbosa abandonou a compostura e rompeu de vez o protocolo.
Acusou Mendes de estar "destruindo a Justiça deste país" e, num rompante descabido, afirmou que o presidente do tribunal não falava, ali, "com seus capangas de Mato Grosso". A reação dos outros oito ministro do Supremo presentes na sessão, encerrada por conta do incidente, foi apropriada. Produziram uma nota em que reiteram a confiança em Gilmar Mendes e lamentam o episódio. Evitou-se uma censura explícita à conduta do ministro Joaquim Barbosa, o que só faria prolongar uma discussão a rigor estéril e desgastante para o tribunal.
Pois é certo que embates desse tipo - que infelizmente vêm se acumulando na formação atual da corte - prejudicam a imagem do Supremo Tribunal Federal, casa que deveria cultivar a solenidade no trato entre seus integrantes. Mas é um evidente exagero afirmar que o episódio seja sintoma de crise no STF. Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e os seus outros nove colegas fazem parte de uma bancada de ministros que está redefinindo, para melhor, a vocação do tribunal.
Os brasileiros pouco a pouco se acostumam a lidar com uma corte de fato constitucional, que enfrenta e resolve assuntos importantes para o cotidiano da sociedade e das instituições. É de interesse público, ainda mais nesse contexto, que a composição do STF reflita uma diversidade de tradições do direito e de visões de mundo.
É igualmente importante que o formalismo exigido dos integrantes do Supremo não seja empecilho à explicitação, inclusive de maneira apaixonada e veemente, de suas discordâncias. Mas os debates precisam respeitar os limites técnicos do saber e do repertório jurídico, pelos quais podem fluir interpretações divergentes e mesmo conflitantes. Até por isso, a corte deveria guardar na sua memória o episódio desta quarta-feira, como antiexemplo.
Fonte:Folha de São Paulo
O Ministro Joaquim Barbosa excedeu-se na áspera discussão travada anteontem com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Não se justificam os argumentos "ad hominem" e a linguagem desabrida empregada por Barbosa em sessão aberta na mais alta corte brasileira.
É notória a desproporção entre o objeto do debate - uma lei paranaense que estende a aposentadoria do setor público a funcionários de cartórios, considerada inconstitucional- e a exaltação dos dois debatedores. Mendes entendeu que Barbosa o estava acusando de sonegar informações sobre os autos e a seguir insinuou que o ministro faria julgamento "por classe" social.
Joaquim Barbosa então retrucou, dando a entender que outros ministros não zelavam pelas conseqüências de suas decisões. Mendes elevou ainda mais a temperatura ao dizer que Barbosa "não tem condições de dar lição a ninguém". Foi no ato seguinte, entretanto, que o ministro Barbosa abandonou a compostura e rompeu de vez o protocolo.
Acusou Mendes de estar "destruindo a Justiça deste país" e, num rompante descabido, afirmou que o presidente do tribunal não falava, ali, "com seus capangas de Mato Grosso". A reação dos outros oito ministro do Supremo presentes na sessão, encerrada por conta do incidente, foi apropriada. Produziram uma nota em que reiteram a confiança em Gilmar Mendes e lamentam o episódio. Evitou-se uma censura explícita à conduta do ministro Joaquim Barbosa, o que só faria prolongar uma discussão a rigor estéril e desgastante para o tribunal.
Pois é certo que embates desse tipo - que infelizmente vêm se acumulando na formação atual da corte - prejudicam a imagem do Supremo Tribunal Federal, casa que deveria cultivar a solenidade no trato entre seus integrantes. Mas é um evidente exagero afirmar que o episódio seja sintoma de crise no STF. Gilmar Mendes, Joaquim Barbosa e os seus outros nove colegas fazem parte de uma bancada de ministros que está redefinindo, para melhor, a vocação do tribunal.
Os brasileiros pouco a pouco se acostumam a lidar com uma corte de fato constitucional, que enfrenta e resolve assuntos importantes para o cotidiano da sociedade e das instituições. É de interesse público, ainda mais nesse contexto, que a composição do STF reflita uma diversidade de tradições do direito e de visões de mundo.
É igualmente importante que o formalismo exigido dos integrantes do Supremo não seja empecilho à explicitação, inclusive de maneira apaixonada e veemente, de suas discordâncias. Mas os debates precisam respeitar os limites técnicos do saber e do repertório jurídico, pelos quais podem fluir interpretações divergentes e mesmo conflitantes. Até por isso, a corte deveria guardar na sua memória o episódio desta quarta-feira, como antiexemplo.
Fonte:Folha de São Paulo
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