sexta-feira, 24 de abril de 2009

Responsabilidade solidária do Estado por dano ambiental

Há algumas semanas, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Estado de São Paulo tem responsabilidade solidária por dano ambiental resultante da construção de lotes irregulares no Parque Estadual de Jacupiranga (SP).

O acórdão entendeu que a decisão que condenou apenas a proprietária do imóvel a ressarcir os danos causados ao meio ambiente deve ser estendida também ao ente público, que, em ação regressiva, pode buscar reparação contra o causador direto do dano. De acordo com a notícia publicada no sítio eletrônico do STJ, a Segunda Turma considerou que "o acórdão demonstrou claramente que o Estado não cumpriu satisfatoriamente com o dever de fiscalizar o parque, apesar de ter embargado obras no local. Os ministros entenderam que o Estado foi omisso ao não adotar medidas cabíveis contra a invasão e deve ser responsabilizado juntamente com o particular. A ação foi interposta pelo Ministério Público Paulo contra a Fazenda estadual. A responsabilidade solidária, segundo o STJ, nasce, quando o Estado, devendo agir para evitar o dano, mantém-se inerte ou age de forma deficiente. Decisões do Tribunal reiteram que as entidades de direito público podem ser arroladas no pólo passivo de ação civil pública quando do loteamento irregulares em áreas ambientais seja por ação, quando expede alvarás sem autorização dos órgãos de proteção ambiental, ou por omissão, quando falhas no dever de vigilância. Essa posição se reforça por cláusula constitucional que impõe ao Poder Público o dever de defender o meio ambiente para presentes e futuras gerações.

O relator do caso, ministro Herman Benjamin, assinalou que a cláusula de solidariedade não pode implicar benefício para o particular que causou a degradação ambiental em detrimento do erário. Assim, sem prejuízo da responsabilidade solidária, deve o Estado, que não provocou diretamente o dano nem obteve proveito com sua omissão, buscar o ressarcimento de valores despendidos contra o responsável direto, evitando, com isso, injusta oneração da sociedade".Considerando que os aspectos ideológicos que estão por trás desse raciocínio jurídico foram a razão principal da criação, há 15 anos, por um grupo de Procuradores do Estado, do Município e da União, da Administração Direta e Indireta, do então "Instituto Paulista de Advocacia Pública", como seu sucessor o Instituto Brasileiro de Advocacia Pública não pode deixar de manifestar-se a tal respeito.

O IBAP entende que o Estado (leia-se: os cofres públicos, o dinheiro dos contribuintes) não é seguradora universal de poluidores. Tratando-se de invasão de um parque estadual, condenou-se duplamente o Estado que, vítima sob o prisma ambiental, agora o é também sob o prisma patrimonial. Decisões nesse sentido inibem o ajuizamento, pelas Procuradorias de Estado, de ações civis públicas, pois a interposição de medida judicial pelo Estado pressupõe frustração nas tentativas de solução das pendências no plano administrativo (embargos, multas ambientais etc).Levando-se em conta que as ONGs, em quase sua totalidade, não têm condições financeiras de arcar com as despesas de advocacia - e que uma associação de membros do Ministério Público está questionando a constitucionalidade da ampliação da legitimidade nas ACPs por lei que passou a abarcar a Defensoria Pública - quem restará para a defesa domeio ambiente? A resposta é: apenas e tão somente o Ministério Público, uma das três funções públicas essenciais à Justiça.

Tal entendimento fere de morte o art. 129, § 1º da Constituição Federal: "A legitimação do Ministério Público para as ações civis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo o disposto nesta Constituição e na lei".

Um dia, quem sabe o mesmo em que os jornais ponderem que empresas sonegadoras matam mais que homicidas notórios – afinal, fomentam a corrupção, reduzem verbas para a educação, a saúde pública, a previdência social –, talvez nossos tribunais passem a reconhecer nas três funções públicas essenciais à Justiça, sem exclusão de qualquer uma delas, idêntica legitimidade processual para a defesa do meio ambiente.Ademais, reconhecida a responsabilidade solidária entre empreendedor e Estado, não tenhamos qualquer ilusão sobre quem será executado nesta ação em primeiro lugar. A resposta já foi oferecida no acórdão, quando se refere a ressarcimento do Erário pela via regressiva – ignorando, inclusive, as dificuldades que enfrentam os Advogados Públicos, desprovidos que estão da garantia da inamovibilidade, na adoção de medidas judiciais que eventualmente desagradem os apaniguados dos governantes, de forma autônoma e independente.

Nós, contribuintes, já lesados pela invasão do parque estadual que "compramos" com nossos impostos pela via da desapropriação, agora pagaremos pela lesão havida, perpetrada por particular, malgrado o embargo. Entende o IBAP que uma ação civil pública, que não identifica as pessoas físicas responsáveis por suposta omissão do Estado, é uma ação mal instruída. E nós, contribuintes, que também pagamos os salários dos responsáveis pela elaboração de tais peças processuais, podemos exigir em contrapartida uma "advocacia" realmente eficiente, que não nos onere ainda mais, que aponte e corrija as mazelas da Administração Pública, nominando o agente faltoso, que busque naqueles que lucraram com o loteamento irregular em parque estadual o ressarcimento integral do dano causado. A responsabilidade do Estado em matéria de interesses difusos contrapõe a sociedade a si mesma, impondo-lhe ônus por ilícito que não praticou, nem ensejou.

Insituto Brasileiro de Advocacia Pública - Abril de 2009

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